quinta-feira, 7 de outubro de 2010

Nunca use seu poder para prejudicar alguém



Essa frase deve estar ressoando na cabeça do meu filho até hoje, pois foi proferida com muita força e convicção.
É uma longa e complexa história que transita por tempos e lugares distintos e distantes, mas que conserva, em sua essência, um conceito do qual não abro mão e não discuto.
Mas, como eu ia dizendo, aconteceu um fato inusitado na casa de uma vizinha, que fez com que todas as crianças ficassem impressionadas e até mesmo revoltadas.
Um gato invadiu o quintal onde vivia, dentro de uma gaiolinha, um inocente ramster. Apavorado com a presença do ameaçador felino, que tampouco conseguia tocar em qualquer coisa dentro da gaiola, o pobre rato morreu de infarto! É isso mesmo, um ataque cardíaco fulminante, desencadeado pelo medo do provável predador.
As crianças não se conformaram, dentre elas, meu filho.
Tempos depois, digamos, muitos meses depois, fui buscar meu filho nas quadras, à noite para ir para casa dormir.
Depois de jantar, banho tomado e já de pijama na cama ele me chamou e disse que havia prendido um gato na quadra de tênis. Fechou o portão e o deixou lá dentro, sozinho.
Eu perguntei por qual motivo ele tinha feito aquilo e ele respondeu que achava que era o gato que matou o ramster da Sarah.
Parecia que ia chover e eu o fiz levantar, trocar de roupa e subir até a quadra para soltar o gato. Pedi que ele imaginasse o gato preso, sem poder sair, tomando chuva, passando fome. Perguntei se ele se sentia confortável com essa idéia. Ele respondeu que não e foi libertar o gato com a frase na cabeça momentos antes duramente ouvida: “Nunca use seu poder para prejudicar alguém”.
Conversamos muito depois, ele me lembrou que eu não gosto de gatos, o que é verdade, mas nem por isso me julgo no direito de maltratá-los e que ele precisava pensar e agir da mesma forma.
Usar o poder é um ato que exige extrema responsabilidade e consciência, senão, exemplos como temos diariamente presenciado, sempre irão se repetir.
O grandioso jornal O Estado de São Paulo, indignado com a censura imposta pelo Supremo, faz seus colaboradores bradarem várias vezes ao dia que está há 400 e tantos dias sem poder publicar notícias sobre a Operação Boi Barrica, ligada a ‘famiglia’ Sarney.
Esse mesmo jornal demite Maria Rita Kehl, autora de um dos textos mais sensacionais que tive o prazer de ler nos últimos tempos. E por qual motivo? Censura?
O uso do poder não pode simplesmente atropelar a honestidade. Conceito que aprendemos no berço. Comigo, pelo menos foi assim. Cresci ouvindo que meu pai era burro por ser honesto demais e por isso seria sempre pobre. Mesmo assim, preferi seguir seu caminho, caminho esse que ele defende com rigor e veemência e do qual nunca esteve disposto a pisar fora. E nem eu.
E você, conhece algum pobre que já foi no Tahiti? Eu já fui.
Conhece algum pobre que joga tênis? Eu jogo três vezes por semana, no mínimo.
E, para fazer isso, nunca tive que deixar de lado a honestidade e o caráter. Nunca tive que enganar ninguém.
A desigualdade social me incomoda profundamente. Eu também recebi o e-mail do zelador do prédio citado pela Maria Rita Kehl em seu artigo que custou-lhe o emprego. A única diferença é que o meu prédio fica no Rio Grande do Norte e não no Ceará.
Embalada pela mesma indignação, mas não com a mesma propriedade da autora, respondi ao amigo que me encaminhou o relato:
“Meu caro, o Estado é absolutamente responsável pelos seus cidadãos.
As políticas sociais têm obrigação de acabar com as distorções e os abismos econômicos que predominam em nossa história desde que esse País foi inventado.
Essas ações simplesmente tiraram da condição de miséria cerca de 20 milhões de pessoas que passavam fome e por isso viviam como animais, sem a menor perspectiva de futuro.
Você já viu uma família de carvoeiros no cerrado? Pai e mãe e uma dezena de filhos morando dentro dos fornos pretos de fuligem, sem roupas, sem comida, sem escola, sem saúde, sem dignidade alguma. E eram pessoas, não eram bichos, mas viviam como tal.
Claro que sempre existirá um ‘espírito de porco’ pelo mundo a fora que irá se aproveitar da situação ilicitamente, tirar partido, roubar, corromper. O Brasil é um país corrupto, esqueceu? E essa doença atinge todos os níveis e classes sociais. O individual sempre suplanta o coletivo nas decisões mais intimas de cada um , de uma forma geral. Salvo os caridosos, que sempre existiram em uma quantidade irrisória, e agora os conscientes que lutam por mudança, por justiça social, por melhor distribuição de renda, pelo fim da desigualdade.
Para nós, a quem nunca faltou comida, nada ou pouco muda. Muda é o destino do dinheiro que sempre pagamos de impostos. Não estamos pagando mais, sempre pagamos muito, mas muito mesmo, absurdamente muito.
Quando o ‘câncer’ da corrupção for dizimado dessas plagas, certamente pagaremos menos, e certamente os menos favorecidos receberão mais.
Outros ‘sapos barbudos’ já defendiam essa idéia há um par de milênios atrás, não?


Que a Força esteja conosco!”

E que nunca usemos o nosso poder para prejudicar os outros.

2 comentários:

  1. Lala querida,

    encontrar você no facebook alguns meses atras me deixou feliz. Ler seu texto e saber que velha Lala continua a mesma me deixou pra lá de feliz.
    Obrigado e um beijo,
    Fernando

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  2. Pois é.
    Ainda somos os mesmos e vivemos como nossos pais!
    Bjs

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